sexta-feira, 31 de julho de 2009

Linha



Era assim
Uma linha
Quase transparente
(Con)vivia ligada às minhas utopias
Tão tênue
Só eu a enxergava
(ou imaginava enxergar)
Em uma das pontas
O mundo humano
Na outra extremidade
O meu próprio mundo...
;
Tênua linha
Companheira fiel
Acordava comigo
Seguia-me onde quer que eu fosse
Acompanhava-me às compras
Por vezes até às refeições
[nem sempre as mais saudáveis, mas, com certeza, as mais rápidas...]
Compartilhava das minhas leituras
Das minhas músicas
Das minhas ideias
Das minhas manhas e manias
Dos dias de futebol
E das tardes de arrebol
Compartilhava até das minhas poucas loucuras...
;
Tênue, quase invisível linha
No trabalho, me desaprovava
Sempre que me distraia
Mesmo assim planava comigo além das nuvens de algodão
Esvoaçávamos juntos campos de girassóis
Na contramão do sudoeste
Navegava comigo por planos psicodélicos
Sondávamos juntos ilhas desabitadas
Parapenteava comigo campos, rios, além-mares
Visitávamos juntos os mais ermos lugares...
;
Um dia sem magia
Nem alegoria
Sem um "ai"
Nem um gemido
Uma palavra, um toque, um baque, um encontrão ou qualquer outro gesto
Essa tênue quase invisível, inimaginável, improvável, imensurável linha
Se rompeu
Penso que tenha se cansado
E deixado de lado
A minha presença simplista
A minha ausência egoísta
Tenha se libertado
Do meu ego afagado
Apagado...
;
E a música
Que toca no fundo
Vai continuar tocando
Mas daqui pra frente
Sem a tênue linha
Meu elo
Pra me me fazer cantar
Sem ela
Meu elo
Pra me conduzir
Sem me inibir
Sem ela
Meu elo
Pra me ouvir
Sem me reprimir
Sem ela
Meu elo
Minha certeza
Dos dias melhores
Que haveriam de vir...
:..........................:

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Canto triste



Pequeno menino frágil
De onde vem tamanha força...?
Nesse lugar que não é o seu lar
Estranhas mãos a te apertar
Até que perca o ar...
Nesse leito que não é o seu
Nessa batalha
[essa, sim, sua]
Desigual, é verdade
Quem te disse covarde
Não imagina a agulha que te corta
Nem o frio que te consome
Não sabe o que é ver água e não sentir sede
Ter comida e não sentir fome...
:
Pequeno menino frágil
Por que você luta desarmado...?
Por que não se vale
De suas garras
De seus dentes...?
Que sala é essa...?
Quem é essa gente diferente...?
Onde estão seus amigos...?
Seu cantinho...?
Seu colinho...?
Seu sol quentinho...?
Será que em seu olhar distante
Sonha com aquela menininha
Magrelinha
Que virou estrelinha...?
Ou com aquele pardal no varal
Que voou assustado
Temendo que lhe fizesse algum mal...
:
Pequenino forte menininho
Quem te preparou pra tanta dor
Se sempre recebeu tanto carinho
Sempre conheceu tanto amor?
:..........................:

terça-feira, 7 de julho de 2009

Arrebol



Anoiteço
Sem estrelas
Exploro
Incautos planetas
Espalho
Doidivanos cometas
Expulso
Cósmicos gametas
Explodo
Espectrais vinhetas
Incendeio
Lume ao horizonte
Leste
Testemunho
(Des)encontro
Lua e Sol
Aconteço
Luminoso crepúsculo
Amanheço
Solitário arrebol
:....................:

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Tátil



Ecos
Sons
Susurros que guardo
Longe é perto
E mesmo distante
Estás aqui...
Formo a forma
Formão de mim
Entalho um rosto
[teu rosto]
Tátil contorno
Emoldurado
Em madeira nobre
Que golpeio
E entalho lábios teus
Sozinho e silente
Ouço tua fala
Ausente
Entalho a cena
Em versos
Que lembram um olhar
[teu olhar]
No entalhe
Não é permitido errar
Do pó, punhado
Ao vento
Sopro o medo
Ao fogo
Forjo em negro
Fecho os olhos
Passeio meus dedos
Permeio fendas
Sinto veios
Recordo vãos
Contorno estradas
Detalhes
Táteis entalhes
Enfim
Marcas profundas
Entalhadas
Dentro de mim
:............................: